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47. Espíritos de outras tradições espiritualistas podem trabalhar em Centros Espíritas?

  • Foto do escritor: Patrick  Lima
    Patrick Lima
  • 14 de jul. de 2024
  • 8 min de leitura

Atualizado: 20 de jun.

Não apenas podem como trabalham com frequência. Espíritos como Pretos-Velhos, Caboclos, Boiadeiros, entre outros, costumam ter suas presenças solicitadas – por uma parcela dos dirigentes espíritas – para colaborarem nas atividades pertinentes às reuniões mediúnicas, auxiliando nos processos de desobsessão, desmanche de trabalhos de magia, etc.

Imagem colorida e de alta resolução de Allan Kardec, com um fundo escuro semelhante a uma lousa escolar. A imagem destaca o retrato de Kardec em um estilo detalhado e nítido.
Espíritos de outras tradições espiritualistas podem trabalhar em Centros Espíritas?

Além disso, como nos foi dado a observar, há uma infinidade de médiuns espíritas que têm como guias espirituais entidades que se apresentam sob variados arquétipos, como Marinheiros, Exus, Pombagiras, Erês, Ciganas... Consequentemente, quando esses medianeiros participam de suas respectivas reuniões nas casas espíritas, seus mentores também estão presentes, buscando auxiliá-los conforme os trabalhos em andamento.


Da mesma forma, os Espíritos benfeitores que trabalham nas casas espíritas – como Bezerra de Menezes e outros – também costumam colaborar em variados núcleos espiritualistas ou religiosos, tal qual os templos evangélicos, igrejas católicas, mosteiros, etc.



BEZERRA DE MENEZES COMO UM PRETO-VELHO?


Pela psicografia de João Nunes Maia, o autor espiritual Lancellin conta-nos uma história onde a equipe espiritual que ele faz parte, sob a supervisão do benfeitor Miramez, colabora em um trabalho espiritual de matriz africana (Iniciação – Viagem Astral; cap. Aprimorando ideias).


Em seu livro Loucura e Obsessão, Manoel Philomeno de Miranda – por meio da mediunidade de Divaldo Franco – relata um curioso caso em que o médico dos pobres, Dr. Bezerra de Menezes, realiza um atendimento em um templo umbandista sob o arquétipo de um preto-velho.


Casos semelhantes aos descritos acima são bastante frequentes na literatura e na prática espírita. Entretanto, devido ao preconceito ainda enraizado em nossa cultura, diversos núcleos, autores e oradores espiritistas, optam por manter-se discretos sobre esses assuntos, evitando comentar a participação ativa dessas entidades nas casas e reuniões propriamente espíritas.


Lamentavelmente, o preconceito e a intolerância religiosa ainda prevalecem na maioria das instituições kardecistas (sob o uso do termo kardecista, vide questão 44). Como efeito, entidades que não apresentam o perfil do homem branco ou de ancestralidade europeia são discriminadas e rejeitadas ao se manifestarem nas reuniões espiritistas. Apesar disso, esses Espíritos iluminados e compassivos continuam a nos ajudar, adotando aparências que nos tragam a sensação de simpatia e confiança.


Acerca do preconceito e da intolerância acima citados, não nos referimos à doutrina espírita em si, mas sim às pessoas que lideram instituições e núcleos espiritistas e que, eventualmente, ainda manifestam atitudes preconceituosas, comportamentos elitistas ou qualquer pensamento contrário aos ensinos do Cristo (que tem como base o amor, a caridade e o respeito para com o próximo).



ARQUÉTIPOS


Ao usarmos a expressão arquétipo (do grego arkhétypon; do latim archetypum) no contexto espiritual, estamos nos referindo a um conceito presente nas religiões de matriz afro-brasileira. Nesses segmentos religiosos, cada entidade se manifesta usando a roupagem fluídica que melhor expressa a sua linha de trabalho, isto é, que reflita as características pertencentes ao seu estado evolutivo, como a bondade e sapiência, a caridade e o amor, a sabedoria e a humildade...


É importante frisar que estas entidades que se apresentam sob a aparência de índios, ex-escravizados e ciganas, por exemplo, não necessariamente foram – em encarnações pretéritas – estas personalidades.


Voltando ao exemplo acima, referente ao Dr. Bezerra de Menezes, veremos que o benfeitor espírita aqui mencionado, em sua última encarnação, atuara como médico. Este fato não lhe impediu de colaborar espiritualmente em um terreiro de umbanda sob a roupagem de um Preto-Velho, ou seja, um Espírito de um ex-escravizado que geralmente se apresenta com linguagem simples e sábia, com humildade e paciência, com amor e carinho.


Entretanto, não esqueçamos a velha sabedoria popular: as aparências enganam! E como enganam! Kardec, em seus escritos, já nos alertava sobre as artimanhas de Espíritos levianos, inteligentes e astutos, que, estando moralmente atrasados, se disfarçam de figuras ilustres (com nomes veneráveis) e empregam palavras rebuscadas para ludibriar e iludir o agrupamento mediúnico.



COMO SABER SE UM ESPÍRITO É DE ORDEM ELEVADA OU INFERIOR?


Reconhece-se um espírito por sua linguagem, assim nos orientou Allan Kardec. Segundo o codificador, por meio da obra Resumo da Lei dos Fenômenos Espíritas, os Espíritos de ordem elevada – que são verdadeiramente superiores e bons – apresentam linguagem sempre digna, nobre, lógica e isenta de contradições ou palavras inúteis; suas comunicações refletem sua sabedoria, a benevolência, a modéstia e a mais pura moral.


Já os Espíritos menos evoluídos, marcados pela vaidade, orgulho ou pela ignorância, frequentemente compensam a superficialidade de suas ideias com um discurso excessivo e vazio. Pensamentos equivocados, máximas contrárias à moral, conselhos insensatos, expressões grosseiras ou fúteis, enfim, qualquer indício de malevolência, presunção ou arrogância, são sinais inequívocos da inferioridade de um Espírito.

Além da linguagem, ideias e conceitos, a impressão física/orgânica que os Espíritos emanam ao se aproximarem dos médiuns — ou de pessoas mais sensíveis — podem revelar o seu grau de desenvolvimento e adiantamento espiritual.


A aproximação de um Espírito superior é sempre acompanhada por uma sensação boa e agradável, um sentimento de paz e quietude, alegria e bem-estar, bom ânimo e tranquilidade. Já as entidades menos evoluídas, ao se aproximarem dos médiuns, despertam-lhes um abalo desagradável, incidindo em um mix de desânimo e irritabilidade, bem como, perturbações psíquicas e orgânicas, dentre outras percepções negativas.



LINGUAGEM ERUDITA x LINGUAGEM SIMPLES


Ao mencionar o termo linguagem, Kardec se referia ao conteúdo moral da mensagem exposta pelo Espírito comunicante, e não a sua forma de falar, isto é, se a mesma é rebuscada, culta, erudita, simples ou regional.


Muitos são os que apresentam o pensamento errôneo ao acreditar que uma entidade que se manifesta com um teor acentuado de boa oratória, é por isso mais elevada do que aquelas que se comunicam de maneira mais simples ou fora da norma culta. Frequentemente, esse é o argumento inicial utilizado pelos dirigentes espíritas ao rejeitarem a manifestação de entidades que, segundo as suas observações, não seguem o padrão convencional de linguagem.


Para finalizarmos, os Espíritos esclarecidos e elevados, despojados de quaisquer formalismos terrenos, preocupam-se primordialmente com o teor da mensagem que desejam transmitir. Muito mais do que impressionar pelo tipo de linguagem utilizada, estes Espíritos – nobres e superiores – atentam-se ao conteúdo moral da mensagem que visam repassar, tornando-a compreensíveis a todos, independentemente de ser culta, erudita, coloquial, formal, regional, popular, dentre outras. (Mediunidade: Desafios e Bênçãos | Manoel Philomeno de Miranda, pela psicografia de Divaldo Franco).



EXU NÃO É DIABO

Muitas pessoas também acreditam, equivocadamente, que essas entidades representam o mal. Essas crenças fazem parte de um preconceito enraizado em nossa sociedade, que supervaloriza a cultura europeia e do homem branco, enquanto demoniza tudo o que tem origem africana e/ou está ligado ao homem negro e sua ancestralidade.


No livro Prazer, Umbanda!, o autor e cientista religioso Bernardo D'Oxóssi destaca que ao contrário do que muitos acham ou falam até hoje, Exu não faz o mal. Na verdade, essa imagem de fazedor do mal se deve a influência Católica na colonização e formação político-social do Brasil, onde Exu foi logo associado ao Diabo e essa ideia foi reforçada através da ligação do arquétipo Exu aos demônios da Goetia europeia nos primórdios da Umbanda e da Kimbanda.


De fato, certas vertentes mediúnicas têm como objetivo a prática do mal, como é o caso da Kiumbanda ou Quiumbanda (não confundir com a Kimbanda). A Kiumbanda trabalha espiritualmente com Espíritos conhecidos como Kiumbas. Esses Kiumbas, quando encarnados, já praticavam a maldade e, agora, no plano espiritual, continuam a agir de forma maléfica por livre e espontânea vontade, compreendendo plenamente suas ações. Em resumo, os Kiumbas são Espíritos que sentem prazer em praticar o mal e se deleitam com cada oportunidade de atormentar os encarnados, fazendo isso sem medir esforços.


Já a Umbanda possui três conceitos fundamentais que são: Luz, Amor e Caridade. À semelhança do Espiritismo, na Umbanda não há nenhuma prática do mal. Para os Umbandistas, Jesus também é tido como referência central, modelo e guia. Desse modo, a prática da caridade, o amor fraternal e o Evangelho de Jesus são os seus pilares centrais.



EMMANUEL COMO SENADOR ROMANO

Sabemos ainda que os Espíritos que se apresentam sob as vestes da simplicidade cabocla ou africana, por exemplo, não se apresentam dessa maneira por estarem presas ao seu passado, mas por escolha própria. Da mesma forma, encontraremos o benfeitor Emmanuel – guia espiritual de Chico Xavier – sob a aparência do senador romano Publius Lentulus (uma de suas reencarnações).


É sabido que Emmanuel reencarnou outras vezes, seja como padre, bispo, escravizado, educador, dentre outras, mas, que prefere apresentar-se sob a figura da sua encarnação romana, à época de Jesus. O que não significa que ele esteja preso a essa encarnação ou aparência, muito menos seja considerado inferior por isso; é apenas a forma, o molde que ele prefere se apresentar.



USO DE CACHIMBOS E VELAS NA CASA ESPÍRITA?

Há um argumento recorrente entre os dirigentes espíritas para impedir a manifestação de entidades que, segundo eles, não se alinham ao padrão europeu de civilidade. Para tais dirigentes, esses Espíritos – popularmente associados a outras vertentes mediúnicas, como umbanda e candomblé – são considerados inferiores por utilizarem cachimbos, bebidas, velas, defumadores, etc.


Entretanto, o uso desses elementos não denota nenhuma inferioridade. O álcool, por exemplo, utilizado geralmente pelos Exus e Pombagiras, é usado para garantir a integridade energética do médium (e não do Espírito). Já o fumo, comumente associado aos Pretos-Velhos, costuma ser utilizado como meio de descarrego, dispersando as energias malsãs (equivalente ao passe espírita). Desse modo, podemos concluir que essas entidades não bebem ou fumam, elas manipulam com maestria as energias fluídicas desses elementos, usando-as para variados fins.


Esses mesmos Espíritos que se utilizam dessas ferramentas em seus atendimentos, quando se apresentam para trabalhar em outros ambientes – como as casas espíritas –, na qual esses hábitos não são aceitos ou não são de costume, realizam seus trabalhos da mesma maneira, sem necessariamente terem estes elementos em mãos, ao seu dispor. É dessa forma que estas linhagens espirituais também trabalham nos centros espíritas, respeitando a cultura e o modo de trabalho de cada lugar.



FRANZ MESMER COMO VOVÔ PEDRO

Para refletirmos sobre nossos preconceitos, é fundamental lembrar da origem da Pomada Vovô Pedro, que ainda hoje proporciona cura e alívio a diversas enfermidades, incluindo a hanseníase.


No início da década de 1970, o médium João Nunes Maia acabara de psicografar a obra Além do Ódio, pelo Espírito Sinhozinho Cardoso. A pedido da espiritualidade, o livro foi lançado na colônia de hansenianos Santa Isabel (Betim/MG), na qual todas as famílias presentes receberam um exemplar da obra gratuitamente.


Ao término do evento, um cortejo de Espíritos desencarnados, sob a visão mediúnica de João Nunes Maia, adentrou o salão. Dentre os Espíritos que se mostraram visivelmente como ex-escravizados, um deles ganhou destaque especial. Assinando sob o nome de Vovô Pedro, esse Espírito ditou a receita de uma pomada que, por apenas um preço – Deus lhe pague – se tornaria um símbolo de cura.


Anos depois, ao visitar a Biblioteca Municipal de São Paulo, em posse de uma enciclopédia, o médium João Nunes Maia se depara com uma fotografia que lhe chama a atenção, reconhecendo ali, naquela imagem, a figura do Espírito Vovô Pedro. Eis que surge – em Espírito –, o criador da teoria do magnetismo animal (mesmerismo), o médico, teólogo, linguista e filósofo austríaco Franz Mesmer, que diante de João Nunes Maia revela o seu verdadeiro nome (referente à sua última encarnação conhecida).


Portanto, o Espírito que outrora apresentou-se com um nome sem elegância, rodeado por ex-escravizados, ditando uma fórmula simples para uma pomada simples (como costumava chamar), era na verdade, um dos personagens mais ilustres da nossa história, um Espírito de escol, responsável por trazer a lume os estudos referentes aos fluidos e a cura pelas mãos; a posteriori, o seu trabalho influenciou diretamente os estudos e pesquisas de Allan Kardec, cujas obras da codificação mencionam diretamente – e por diversas vezes – o magnetismo descrito por Mesmer, além da atribuição de três mensagens mediúnicas escritas/ditadas por Mesmer, publicadas nas edições de janeiro de 1864, outubro de 1864 e maio de 1865 da Revista Espírita.




Texto extraído do livro Mediunidade com Kardec de Patrick Lima.

Capítulo 4: O Médium e a Casa Espírita

Pergunta 47: Espíritos de outras tradições espiritualistas podem trabalhar em Centros Espíritas?

Como citar: LIMA, Patrick. Mediunidade com Kardec. Poverello Edições, 2023. 1ª ed.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


MAIA, João Nunes (psicografia). Iniciação Viagem Astral. Lancelin (espírito). Fonte Viva, 22ª edição, 2017.

FRANCO, Divaldo Pereira (psicografia). Loucura e Obsessão. Manoel Philomeno De Miranda (espírito). FEB Editora, 2016.

KARDEC, Allan. Resumo da Lei dos Fenômenos Espíritas. Tradução de Salvador Gentile. IDE Editora, 2012.

FRANCO, Divaldo Pereira (psicografia). Mediunidade: Desafios e Bênçãos. Manoel Philomeno De Miranda (espírito). Editora LEAL, 2019.

D'OXÓSSI, Bernardo. Prazer, Umbanda!: História, Conceitos e Teorias. Reconecte Produções, 2021.

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